Do outro lado
daquele bar que cheirava a madeira molhada e com bancos vermelhos envernizados,
Lívia estava com João Pedro e sua até-então namorada discutindo política, o que
com o passar das horas parecia ficar cada vez mais atrativo enquanto a bebia
descia seca pela garganta. Olhava para os lados, como que em uma tentativa de não
parecer vidrada em João e acabar constrangendo-se perto da “dama” que o estava
acompanhando. Conhecia João Pedro há aproximadamente um ano e meio, e nesse
meio de tempo tornaram-se tão próximos que ela já não saberia o que faria caso
precisasse deixar a cidade, muito embora já estivesse cansada de levar adiante
o que sentia por ele. João tinha um vasto conhecimento na sua área de atuação,
a psicologia, e provavelmente já entendia o que Lívia estava sentindo, até
porque era para ele que ela corria todo dia, toda noite, enfim, quando a
solidão batia, Lívia não ligava para seus amigos ou sua melhor amiga, gostava
da companhia de João Pedro.
Havia uma
certa ironia em tudo isso, pois ela sentia que quanto mais se aproximava dele,
mais tinha certeza de que tão-logo gostaria de se casar, formar uma família ou
qualquer coisa que o valha. Afinal, já não era mais uma garota de vinte anos –
aproximava-se do terrível número 30 – e isso às vezes pesava muito em suas
decisões. Preferia passar a noite sozinha do que se envolver com um cafajeste
por uma noite, e talvez por isso que sempre estava ao lado de João. Porém,
encantava-se cada vez mais com a forma de ele ver o mundo, com o seu sorriso,
seus cabelos castanhos banhados em gel e sua desenvoltura para falar sobre
qualquer coisa. João lecionava Psicopatologia e Teoria Psicanalítica na mesma
universidade em que Lívia trabalhava, fato que, por si só, já fazia o coração
ingênuo de Lívia bater mais forte. Aliás, assim que suas amigas e sua irmã a
definiam: coração ingênuo demais.
Enquanto ouvia
uma banda de rock tocar no palco, lembrava-se de quando conheceu João Pedro, e
de como sentiu raiva de si por gostar de um cara tão engomadinho, tão certinho.
Talvez os seus últimos romances tivessem testado tanto a sua paciência que
agora envolver-se com alguma encrenca parecia perda de tempo. Mas, no fim de
tudo, envolvia-se na maior encrenca amorosa até então, pois via João
todo-santo-dia, sabia que não deixaria de lado o sentimento e chegaria um
momento em que ela iria explodir.
Entre um gole
e outro, sua cabeça já estava começando a girar quando avistou Thomas. Um pouco
mais alto que ela, cabelos castanhos escuros e cacheados, com algumas mechas
impedindo a troca de olhares. Thomas estava com um grupo de amigos e empinava a
garrafa de cerveja em meio às risadas e à cantoria. Lívia fitou-o até que ele
percebesse. Thomas estava de lado quando virou a cabeça para a direita e
avistou Lívia, com um copo de uísque na mão direita. Lívia sentiu um arrepio
correr por todo o seu corpo. O olhar daquele garoto a prendia de uma forma
inexplicável, o que resultou em um sorriso bobo no canto da boca – “até pareço
uma adolescente”, pensou. Desviou o olhar, voltou a olhá-lo, desviou novamente.
Não queria parecer extremamente interessada, talvez por orgulho, talvez por
medo – ficou com a primeira opção. Olhava-o dos pés a cabeça, deixando o álcool
a fazer imaginar como seria o beijo dele, a voz enquanto fala docemente, se ele
era carinhoso ou selvagem.
Minutos
depois, João Pedro e a “namoradinha” despediram-se quando Lívia resolveu ficar
mais um pouco. Tão logo os pombinhos deixaram o recinto, Thomas veio em sua direção.
Lívia fingiu que não tinha percebido e pediu ao garçom que servisse mais um
copo de uísque cowboy. De repente, ouviu uma voz doce e um tanto animada ao seu
lado:
_ Oi, Sra.
Gerstner – disse o rapaz.
_ Ah, olá.
Pelo visto você me conhece – respondeu Lívia, um tanto apavorada.
_ Claro, fui
seu aluno na universidade em Teoria Geral do Estado, semestre passado.
Lívia respirou
fundo e pensou: “Que diabos, qual a idade deste próximo?!”, enquanto sorria e
balançava a cabeça, perguntando-se como nunca o percebeu. A partir daquele
momento sua até então excitação transformou-se em uma pontada de anseio.
_ Posso me
sentar contigo? – disse Thomas.
_ Claro, e
qual o seu nome?

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