Noite no bar.

Vinicius resolveu "dar uma palinha" de suas últimas composições - de dez anos atrás, aproximadamente - e então eu e Geovane resolvemos convidar os amigos mais próximos para vê-lo, pois nada no mundo poderia pagar a felicidade que o Vini ficava em ver os seus amigos rindo, bebendo e curtindo um som - mas ele queria, e muito, que o bar ficasse cheio aquela noite - talvez por isso eu disse a Geovane que deveríamos nos dedicar para fazer com que Vinicius não fosse embora tão cedo daquela maldita cidade. Logo que Vinicius sentou no banquinho alto e apoiou o violão no joelho, o boteco já estava relativamente cheio - e o copo dele também. Ajeitou seus cabelos para trás dos ombros e começou a tocar clássicos do rock gaúcho. Resolvi ficar apreciando de longe aquele momento, ajudando Geovane a identificar as mãos levantadas clamando por mais cerveja e, como de praxe, tomando a minha. A cada meia hora mais pessoas chegavam, algumas que eu nunca tinha visto na minha mísera vida, inclusive. Senti-me um pouco velha quando grupos de adolescentes começavam a chegar e cochichar perguntas do tipo: "que diabos de música é essa?". Ri por dentro e comentei tal fato com Geovane, que, para muito me ajudar, confirmou-me que já não estou mais na casa dos vinte.
Alguns minutos depois, resolvi ir no banheiro, algo me incomodava no pé esquerdo, "talvez uma pedra minúscula", pensei. Antes mesmo de chegar no banheiro, sentei em um sofá vermelho próximo, tirei a sapatilha preta do pé e bati no chão. Enquanto apresentava para todos "a cena da dor", senti que alguém se agachou na minha frente. Levantei subitamente a cabeça, o que fez com que meus cabelos dessem uma surra em quem quer que estivesse na minha frente naquele momento. Quando me recompus e senti que aquele ser na minha frente segurou-se nos meus dois joelhos para não cair, dei-me conta de que tratava-se de Santiago, que mal esperou que eu olhasse nos seus olhos para me lascar um beijo. Quando nos desconectamos, olhei-o por alguns segundos e logo comecei a rir - um pouco porque a forma rápida com que tudo aconteceu atingiu em cheio minha labirintite, e um pouco porque essa era a desculpa que eu dava quando estava tonta de tão bêbada.
_ Ah, oi - disse Santiago, como se seus lábios já não tivessem me cumprimentado.
_ Ah, olha só quem eu vejo! Como diria minha mãe: quem é vivo sempre aparece. Fugiu de quem hoje?
_ Engraçadinha. Quis ver o Vini tocar e também tentar entender um pouco da tua ira naquela noite em que nos vimos na rua, que até hoje eu não entendo.
_ Eu preciso me explicar sobre aquele dia? Tá falando sério? - Joguei-me contra o sofá e soltou uma risada nervosa.
_ Eu não sei se tu tá lembrada, mas tu derramou uísque na minha cabeça e pediu que eu sumisse da tua vida - disse Santiago, fechando a cara.
_ Tu tá certo. Desculpe-me por aquilo. Tem coisas que eu nunca vou conseguir explicar, nem sequer para mim mesma, imagina pra ti - disse Mônica, levando a mão direita em direção a cabeça de Santi e bagunçando-o o cabelo.
_ Certo. Eu só quero que as coisas fiquem assim como estão, você sorrindo e me levando a loucura só com a forma como me olha, Mônica.
_ Você sabe que tudo isso é imprevisível, não é? Talvez daqui duas horas eu mude de ideia e queira colocar nas minhas costas todo o peso que eu sempre levei. Mas olha só, esta noite e agora, eu quero que a gente não seja nada mais do que o que sempre fomos: nós. Sem definição nenhuma, sem culpa, sem arrependimentos. Eu sei, eu sei que um dia a gente vai olhar para trás e não ver sentido nenhum em tudo isso, mas eu tenho certeza que vou conseguir levar nossa história como um súbito de loucura que, embora tenha me atormentado pra caralho, fez-me sentir viva, ao fim de tudo. A gente vai levando assim, Santi, meio aos solavancos. Eu sei que vou achar alguém melhor que você para talvez um dia me apaixonar.
Santiago sentou-se ao meu lado, pegou minha mão e beijou-a. Eu, com a cabeça escorada no sofá, sorri e convidei-o para sentar mais perto do palco, pedindo para que ele relevasse qualquer coisa que Vinicius ou Geovane falassem. "É que eles ainda não sabem do que decidi para mim esta noite", argumentei.
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Autor Reckless Serenade.

Como diria Gabito Nunes: "eu é que tenho mania de - uns chamam de dom, outros de doença psíquica, e eu gosto de conceber isso como um estilo de vida - romancear tudo."

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