She's about to change.


Mônica acordou às 9h automaticamente, que era pra ver se para ele o sol já havia nascido. Se por acaso havia deixado o moletom na sala ou uma xícara manchada de café. Encostou os pés quentes no chão e lembrou-se do sermão que recebia de sua mãe toda vez que caminhava de pés descalços pela casa durante o inverno. Rastejou-se até a cozinha e não viu louças sujas, não achou nenhum moletom e o cheiro dele ainda parecia estar impregnado na casa inteira. Encostou-se na porta da cozinha e esfregou o pé direito, gelado, na canela esquerda. Respirou fundo e soltou um riso irônico. Parecia que cada vez mais esse tipo de situação a irritava, coisa que nunca tinha acontecido, pelo menos até o presente momento. Na maioria das vezes as roupas jogadas no chão pela manhã, a bagunça na pia e as garrafas de cerveja artesanal a irritavam, gostava de organização, gostava de ter certeza de que os Eduardos, Santiagos, Cássios ou Marcelos sempre desapareciam antes do sol nascer. Porque era assim  que as coisas seriam, quisesse ela ou não. Porque essa situação já era cômoda, já não assustava mais e nem causava confusões sentimentais: simplesmente era assim.
Mônica conheceu ele e, de certa forma, convenceu-se, por pouco tempo, de que seria diferente. Talvez dessa vez ela quisesse que fosse, estaria cansada de não ter aquilo que os outros tanto chamavam de amor. Ao mesmo tempo em que queria, sentia-se egoísta por pensar que alguém deveria querer também, o que, de certa forma, era loucura, pois o mínimo que se posse esperar de alguém que a gente gosta é que essa pessoa goste da gente também, correto? Talvez Mônica tivesse o pensamento doentio de que os outros gostarem de ti era um favor, porque o seu temperamento e ansiedade podiam ser extremamente irritantes.
Ele chegou, ele a pegou nos braços e a fez sentir algo que não seria há muito por alguém: carinho. Era um cara que ao mesmo tempo em que era tímido, tinha a especial capacidade de envolvê-la e acompanhar suas gargalhadas. É claro que ela se encantou, isso não é algo que ela podia negar. No entanto, foi preciso apenas quinze dias para que ela começasse a se questionar. A gente nunca sabe quando estamos sendo enganadas ou não, não é? E foi com essa premissa que Mônica relembrou todos os seus últimos quase-romances e começou a crer ser impossível encontrar algo que fugisse daquilo, por mais que delirante fosse esse pensamento. Pode ser que ele seja o cara que vai pegar na tua mão dela no meio da rua por justamente querer estar com ela, mas ao mesmo tempo ele pode ser cínico o suficiente para ser um desses caras que fazem isso com um único e definido objetivo: sexo e sexo. Ela não iria descobrir isso tão cedo.
 Na dúvida, começou a demonstrar um desinteresse sem precedentes, forçou ironias, tentou a todo custo não deixar que "aquele olhar" acontecesse. Mônica sabia o perigo que corria quando ficava muito tempo olhando para o homem que estava ao seu lado, por isso, optou por evitar. Não foi preciso muito tempo para que os celulares desligados e as desculpas esfarrapadas começassem a surgir. Entretanto, Mônica ainda se questionava se as coisas seriam assim mesmo, novamente, ou se dessa vez ela estaria fantasiando negativamente e deixando de viver algo que há muito tempo não vivia. Questionava-se se os anos de indiferença a tinham deixado totalmente descrente de qualquer demonstração de carinho. Lembrava-se dele ajudando-a a colocar o seu casaco quando a única coisa que vestia era a camiseta de seu time, lembrava de suas mãos quentes tentando alinhar os cabelos que tomavam conta do travesseiro. Tinha raiva de si mesmo por pensar nisso tudo, no fim das contas. Não queria romancear, não queria precisar ter que olhar nos olhos dele e dizer que, porra, alguma coisa estava acontecendo. Como muito bem diz Gabito Nunes, é "cedo para dizer ou tarde demais para fugir".
Foi até a janela, olhou para fora e avistou ele descendo as escadas do prédio, escondeu-se atrás das cortinas e pode observar que ele parou no meio do caminho, voltou três lances de escada, olhou fixamente para o prédio, sussurrou alguma coisa e desceu correndo. Foi embora.
Talvez ele tenha esquecido alguma coisa dentro do apartamento, ou esquecido de dizer que queria ficar somente se soubesse, de certeza, que Mônica também queria.
Compartilhar Google Plus

Autor Reckless Serenade.

Como diria Gabito Nunes: "eu é que tenho mania de - uns chamam de dom, outros de doença psíquica, e eu gosto de conceber isso como um estilo de vida - romancear tudo."

Postagens Relacionadas

0 comentários :

Postar um comentário

Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial